Gosto muito de passar dias se ressaca em frente à televisão a ver filmes chungas ou em frente ao computador a ver séries. Desta vez resolvi aproveitar melhor o tempo e ter mais critério na escolha, ou seja, deitar-me em frente ao computador e ver uma série de filmes que, embora não estando na categoria de filme-de-Domingo-à-tarde-da-TVI, não me obrigassem a pensar ou a estar muito atenta. Correu bem. Resolvi fazer este post, que também se poderia chamar 'Como fazer uma crítica a 7 filmes em cinco minutos.' Classificação de uma a três estrelas, pra ser mais fácil.
1 estrela:
(fotograma de I'm Still Here, de Casey Affleck, EUA 2010)Deve ser mesmo fabuloso tirar um ano das nossas vidas pra fazer figura de urso, gozar com a imprensa sensacionalista, com Hollywood, com o Letterman e com os meninos do hip-hop (por acaso o P.Diddy parece ser o único gajo que não cai na esparrela e o manda dar uma curva) e ainda ser pago por isso. Quanto às aspirações mais profundas do 'documentário' - um actor famoso e premiado em conflito consigo próprio e com o mundo, que resolve perseguir o seu verdadeiro sonho e no meio se vai desgraçando fisicamente com recurso a drogas e putas (onde é que eu já vi isto...) - ficam um bocado aquém das espectativas, quer em termos de conteúdo, quer em termos de forma. A 'catarse' final - o reencontro com o pai e com as 'origens' - principalmente a última sequência em que ele vai mergulhando no rio é uma coisa que me fez passar pelas brasas em dois ou três momentos.
(fotogramas de An Education de Lone Scherfig, RU/EUA 2009)
Começo a ficar farta de filmes de meninas que se apaixonam por gajos mais velhos. E este em particular é quase irmão, embora num contexto diferente, de outro filme inglês de 2009, Fish Tank. Meninas que se apaixonam por um gajo mais velho, dão umas trancadas e depois descobrem que eles são casados e têm filhos. Embora no caso de Fish Tank o conteúdo e a forma sejam bastante mais crus que neste. E, mesmo que haja um questionamento explícito do papel da educação e da mulher na sociedade dos 60, fica a ideia de que o que interessa é ires pra Oxford e estudares senão tás fodida.
2 estrelas :
(fotograma de Inception de Christopher Nolan, EUA/RU 2010)
Este devia mas é chamar-se Confusion. Daqueles filmes em que é preciso estar tão atento ao enredo que não sobram neurónios para apreciar outros aspectos do filme. A reter a cena em que não há gravidade. Gostava mesmo de saber como filmaram aquilo. A questão da diferença de tempos entre os diferentes níveis de sonho poderia estar melhor explorada em termos formais...mas pronto, escapa.
(fotograma de The Dark Knight de Christopher Nolan, EUA/RU 2008)
Eu, como fã do Chris Nolan de 'Memento' e um bocadinho de 'Insomnia' fiquei apreensiva quando ele se meteu nestas super-produções. Mas o gajo tem-se safado bem, embora aquela coisa recorrente (podemos ver isso em Batman, OInício e nestes dos últimos aqui referidos) de filmar um diálogo com a câmara sempre a rodar à volta dos actores me enjoe profundamente. Não sei quem raio lhe disse que aquilo funcionava bem, mas pronto.
3 estrelas:
E para equilibrar, mais cabeça e menos efeitos especiais. Gostei especialmente do pequeno formalismo a que ele se permitiu quando representa uma relação sexual através de posições e não do acto contínuo. E é engraçado que podiam ser fotos, mas não, são os gajos mesmo parados durante uns segundos.
(fotograma de Shutter Island de Martin Scorsese, EUA 2010)
E eu que até não sou nada deste género de filmes colei do princípio ao fim. Em parte para descobrir qual era o desenlace - e mais uma vez tive razão, embora tenha que admitir que este me custou mais um bocado. Irritou-me a banda sonora, assim como as cenas de tempestade, demasiado artificiais para a qualidade do resto. Lembrou-me o Hullumeelsus (Loucura) de Kaljo Kiisk, um filme russo dos anos 60, em que um oficial da Gestapo é enviado a um sanatório devido a uma denúcia anónima. Supostamente entre os malucos havia um espião e no decorrer da investigação o oficial acaba por ficar também maluco. No final percebe-se que a denúncia era falsa e tinha sido feita pelo director da prisão, com a intenção de poupar por mais algum tempo a vida dos pacientes, que seriam chacinados mais cedo ou mais tarde pelos gajos da Gestapo.
Também me lembrou o 1984 (o livro), pela lavagem cerebral. E aliás foi com o final do 1984 em mente que consegui descobrir o desenlace. O Ípsilon disse : 'Ao fim das quase duas horas e meia, ficamos aliviados quando identificamos a solução do mistério - e quando damos por nós a perguntar se o mistério ficou realmente resolvido, percebemos que Scorsese ganhou o jogo.' A solução do mistério encontra-se na última fala do DiCaprio, quando ele pergunta a Chuck se é preferível 'viver como um monstro ou morrer como um homem bom'. No ínicio vemos DiCaprio chegar à Ilha como um Marshall que vai investigar o desaparecimento de uma paciente. No decorrer do filme coisas estranhas se vão passando e no final dão-nos a entender que DiCaprio afinal era um paciente da instituição que, negando a si próprio o que tinha feito (matado a mulher que por sua vez tinha matado os seus três filhos) entrava em reset cerebral infinito. Numa tentativa de o curar definitivamente os psiquiatras da instituição conduzem uma experiência a fim de tentar que ele admita a sua realidade e os seus actos. OU...os psiquiatras resolveram trazer um homem são (que tinha alguns traumas no seu passado, o que abria uma brecha para eles trabalharem) para a Ilha e conduzirem uma experiência que tinha em vista uma lavagem cerebral complexa, para o fazerem crer que a sua própria vida era uma mentira?
Quando no final vemos que finalmente DiCaprio aceita a sua condição de assassino (para gáudio dos psiquiatras) acreditamos na primeira versão, ele admite, está curado. Quando no dia seguinte ele aparentemente entra em reset e volta à mesma paranóia de sempre, eles resolvem 'matá-lo', a experiência não resultou. No momento em que ele questiona se é preferível viver como um monstro ou morrer como um homem bom percebemos a sua lucidez e a sua escolha : ser declarado curado através da lavagem cerebral (o que implicava ele admitir ter matado a mulher, embora ele tivesse a a consciência de não o ter feito) ou morrer como um homem bom, ou seja com a consciência da realidade e dos seus verdadeiros actos?
(fotogramas de Io sono l'amore de Luca Guadagnino, Itália 2009)
A gula e a luxúria de novo misturadas. A decandência da burguesia, a morte, a libertação. Tudo muito bem filmado - não posso no entanto concordar com algumas críticas que li por ai que elogiam o domínio de câmara. Se houve coisa que não gostei foi a utilização da câmara.. E nalgumas partes o tipo de corte de plano que é feito, demasiado brusco.